segunda-feira, 16 de junho de 2014

A paternidade...

O  meu pai viajou imenso dos 20 e poucos anos aos 30 e poucos anos, foi mais de uma década de interrails de mais de 1 mês pela Europa fora, sob carris, em mil aventuras com o seu irmão.
Ele viu todos os países da Europa (menos Islândia) mais que uma vez....só a Paris foi 10 vezes. Era um jovem livre, aventureiro, desembaraçado, feliz. Mas depois, aconteceu uma tragédia e a aventura acabou abruptamente!
O que de tão mau aconteceu então? Uma coisa horrível, que todos metem na cabeça que têm de fazer e que os outros também têm de fazer: casar e procriar! (correcção, procriou 1º pois quando se casou a minha mãe já levava brinde).
Ao longo de toda a nossa vida ouvimos pessoas a dizer que o dia do nosso casamento e nascimento dos filhos será dos mais felizes das nossas vidas...eu acho isso um engodo, não para toda a gente, óbvio, resulta para algumas....mas regra geral depois disso, o pouco que resta da juventude de um adulto de 30 e tal anos vai-se apagando no meio de mudanças de fraldas, noites mal dormidas, obrigações familiares...até lidar com hiperativade de crianças curiosas e mais tarde adolescentes impossíveis e irritantes.
O que eu quero dizer, é que, sim, no início parece tudo muito bonito...mas com o tempo apaga-se toda a magia. Não tenho receios em dizer que a partir do casamento e dos filhos o índice de felicidade do meu pai foi decrescendo e decrescendo...até se estupidificar estupidamente num velho de quase 60 anos petrificado em frente de uma TV.
As únicas conversas que tem comigo são para embirrar comigo (o seu passa-tempo predilecto), e absorver como uma esponja as notícias de um mundo cruel, perigoso cheio de assassinos e violadores e criminosos que a TV mostra....pois ele já não vive, não viaja, apenas absorve "informação" de uma caixa falante...que lhe mostra um mundo perigoso, diferente daquele em que viveu...o mundo mudou, diz ele...mas há 20 e tal anos ele não tinha TV para saber das coisas más que aconteciam no Mundo (ou tinha TV mas havia a censura e etc)...e para além disso há 20 e tal anos que ele não vê o Mundo, diz que ele mudou, mas não o foi viver nem experimentar.
Casou-se, domesticou-se, habitou-se ao enfado da vida dos subúrbios, as mesmas rotinas, a mesma quinzena de férias do Algarve, na mesma praia, no mesmo canto da areia, o mesmo lugar para o estacionamento do carro, as mesmas conversas e discussões dia após dia...e arrastaram-me me com eles para esta vida normal e miserável da qual quero escapar, mas da qual só escaparei quando tiver a minha emancipação (leia-se dinheiro) e quando tiver o discernimento de não repetir a vida deles.
Sinto-me arrastada para dentro de um filme de 2ª categoria, sinto que estou a viver o mesmo dia todos os dias...é assim que é viver dentro de um casamento...porque embora sejam os nossos pais quem estão casados, os filhos também vivem esse casamento.
Tudo o que eu quero é ser como o meu pai foi, antes de ser pai, e tudo o que eu gostava era de conhecer a tal pessoa jovem aventureira, livre e feliz que ele foi...mas eu nunca conheci essa pessoa, porque em parte fui responsável pelo desaparecimento dessa pessoa....mas custa-me imenso olhar para o meu pai e ver o que ele é e imaginar o que ele foi...custa-me a crer que uma pessoa pode estar tão desgastada que perdeu a vontade de viver, porque para mim viver é viajar.
E pronto esta é a minha teoria de que jovem, quando te vires livre das amarras dos teus pais, não sigas o seu exemplo, isto é, não te tornes pai ou mãe....torna-te um dia muito tarde, ou não de todo, porque eu cada vez mais acredito que a maior parte das pessoas só vive antes de se enforcar em casamento e obrigações familiares.
Entre escolher a liberdade ou o amor, sei bem o que escolheria: o meu amor à liberdade.
E pronto isto foram os desabafos de uma filha que aprendeu que a pior coisa que me poderia acontecer na vida era ser mãe e consequentemente avó, e etc e etc...
Está aqui uma vez mais a minha tentativa absurda de tentar explicar às pessoas a minha vontade de não ser como elas.