Esta história foi retirada do livro: "A Economia não existe" de Antonio Baños Boncompain, e eu acho que tem tudo a ver com oactual modo de "vida" vigente.
" É conhecida aquela anedota dos sete náufragos numa ilha deserta. Seis deles são orientais e o sétimo é um norte americano muito gordo. No primero dia, são distribuídas as tarefas que todos deverão cumprir de modo a permanecerem vivos. Um ficará encarregue da lenha, outro da pesca, um terceiro da caçã, o seguinte da construção de um abrigo, etc.. Por fim, decidem que o norte-americano deve dedicar-se apenas á tarefa de comer. E assim fazem. Em cada manhã, os seis asiáticos aplicam-se na execução das funções e chegada a noite, esmeram-se na oferta de um magnífico banquete ao norte-americano, o qual , farto de tanta comida, acaba sempre por deixar restos insuficientes para a alimentação dos seis infelizes.
Qualquer pessoa a quem fosse relatado o estranho comportamento dos náufragos levarias as mãos à cabeça e exigiria, no mínimo o exílio do prepotente cara-pálida. Contudo, se explicarmos esta história a um economista ortodoxo, neoclássico, daqueles de cátedra e de tertúlia, a sua análise será tão surpreendente quanto ilustrativa. Afirmará que de facto, os seis asiáticos necessitam do norte-americano porque este constitui, na realidade o motor da economia local. Sem ele e a respectiva voracidade, nunca se teriam desenvolvido as artes da pesca, nem construído infra-estruturas como cabanas, tigelas ou canoas. A percentagem de pescado ou de legumes recolhidos desceria para níveis preocupantes. O PIB, os indicadoresde emprego e actividade seriam os de uma ilha subdesenvolvida. O apetite pantagruélico do norte-americano ocioso foi o que obrigou os asiáticos a realizar uma forte inversão de I+D de modo a maximizar os recursos da ilha. Sem o americano, ninguém teria sido obrigado a aprender a recitar monólogos nem a compor canções de modo a entreter o comensal durante a refeição, pelo que as artes cénicas nunca se teriam desenvolvido na ilha, ostentando assim, um ínfimo nível cultural. Para além de tudo isto, a obrigação de cozinhar um banquete diário fez com que se multiplicassem os contactos sociais entre asiáticos, que se viram obrigados a criar sistemas de coordenação, de repartição de trabalho e distribuição dos recursos,redundando numa maior, mais eficaz e mais completa complexidade social, o que com o tempo, lhes permitirá preparar banquetes cada vez mais elaborados, facto que despertará neles dotes de iniciativa e liderança.
Torna-se por isso, bastante evidente que o desenvolvimento económico seria inconcebível não fora a presença do nosso amigo americano. Se morresse de uma apoplexia, o mais provável é que os sobreviventes trabalhassem apenas três ou quatro horas de modo a assegurar a sua subsistência e passassem o resto do dia deitados. Isso daria origem a uma quebra da produtividade, e levaria à ruína a emergente nação insular. Cada um permaneceria no seu bocado de praia e a estrutura de comando e funções acabaria por se dissolver. Passariam a levar uma vida muito próxima da bestialidade. A ausência de um objectivo comum, de um trabalho, em resumo, faria deles indivíduos preguiçosos e desconfiados.Seria apenas uma questão de tempo até surgirem querelas, desprezo e orgulho entre os outrora submissos e coperantes asiáticos. A morte do americano constituirá a desgraça dos asiáticos.
Esta história, nascida dos engenhosos grupelhos de Wall Street nos velhos dias de euforia, descobriu nos últimos achados da arqueologia uma confirmação surpreendente: de acordo com esses dados, e segundo as últimas teorias sobre a Revolução Neolítica tudo leva a crer que os primeiros cultivos, a primeira agricultura, nasceram devido às ordens do "norte-americano" da aldeia, e com um único objectivo: reforçar, mediante a acumulação de alimentos, o seu estatuto dentro da tribo. Estudos feitos há cerca de cinco anos, nos restos arqueológicos dos primeiros agricultores do Médio Oriente, indicam que estes viviam substancialmente menos tempo e em condições muitom mais insalubres que os caçadores-recolectores que os antecediam. Ou seja, as sociedades que produziam mais alimentos, as que eram excdentárias, possuíam, paradoxalmente, uma população mais sujeita aos rigores do trabalho e da tirania.
Como se vê, a necessidade de acumular recursos pode ser positiva para a história económica, para o anafado norte-americano da ilha, para os cmerciantes holandeses do século XVIII ou para o banqueiro contemporâneo, mas não é obrigatóriamente para a maioria das pessoas dessa e de outras ilhas, cujas expectativas passam por levar uma vida simples e confortável.