sábado, 24 de novembro de 2012
O que é a Alemanha?
Esteve cá a Sra Merkel [...] Recordo, a propósito, um livro que volta a ter hoje o maior interesse. Trata-se da Correspondência de um Diplomata [português] no III Reich. Veiga Simões: ministro acreditado de Berlim, de 1933 a 1940, da autoria de Lina Alves Madeira (ed. Mar da Palavra]. O livro de cerca de 40 telegramas diplomáticos enviados para Lisboa pelo nosso embaixador em Berlim, Alberto da Veiga Simões, que ali chegou em Setembro de 1933- ano da nomeação de Hitler como chanceler - e onde se manteve até ao início da II Guerra Mundial. Pode dizer-se que ele - um republicano liberal - foi o nosso embaixador em Berlim nos oito anos e meio de paz, que o nazismo apesar de tudo manteve, sendo substituído por um «germanófilo» no início dos seis anos de guerra impostos pela demência de Hitler.
Para quem conheça a ideologia nazi, esta correspondência não traz novidades no plano das ideias; mas trá-las, e muitas, no campo dos factos políticos, económicos e sociais, bem como no aspecto do discurso oficial do Poder Nacional-Socialista. Mostrando, em Berlim, os seus notáveis dotes diplomáticos, Veiga Simões nunca escondeu, nos seus telegramas, as críticas que lhe merecia o novo regime político implantado na Alemanha pelo Partido único, dito «Nacional Socialista».
Recomendo aos meus leitores, vivamente, que consultem este livro, e meditem bem nele. Talvez não fiquem surpreendidos pela brutalidade dos métodos nazis, de que já por certo ouviram falar. Por certo se lembrarão dos grandes objectivos políticos de Hitler: nacionalismo ariano; o racismo (antijudaico, mas também antieslavo, e por isso antiploaco), a reinvidicação de um maior «espaço vital» para o povo alemão, quer na Europa, quer nas antigas colónias africanas, quer ainda no «fantástico celeiro» da Ucrânia; e, por último, mas não em último lugar, a ambição hegemónica sobre toda a Europa e contra a Rússia comunista.
Tudo isto estava já anunciado no Mein Kampf desde 1925-27. Mas há um aspecto menos conhecido: à esperança suscitada em muitos setores do povo alemão (sobretudo entre os desempregados) pela subida ao Poder do grande orador que era Hitler, seguiu-se um primeiro período de quatro anos (1933-37) de «políticas de austeridade», que os alemães aceitaram bem, por espírito patriótico; mas quando, em setembro de 1937, no congresso partidário anual de Nuremberga, Hitler anunciou «mais quatro anos de austeridade», todo o regime entrou em crise, porque começou rapidamente a perder apoio popular. Assim, a guerra iniciada em 1939 não foi só a consequência lógica de expansionismo germânico: foi também a opção oportuna pelo instrumento clássico de salvação dos regimes em queda livre, que é a guerra contra os inimigos exteriores à Pátria e, por isso, a necessidade de uma forte unidade nacional.
A este propósito, são notáveis os telegramas de 14-9-1936, de 25-4-1937 e de 22-10-1937, onde o nosso embaixador tudo informa, tudo explica, e chega a prever (no último texto), com dois anos de antecedência (!), que Hitler desencadeará (!), uma guerra.
Ouçamos algumas das suas lúcidas palavras, um ano antes de mentira de Munique (30-9-1938):
«O estado Alemão, não pode ter por finalidade o cada vez maior sacrifício da população dentro (das) fronteiras, arranca-lhe sacrifícios na mira de uma acção para além delas. E, no estado atual da Europa, essa acção só pode ter por instrumento- a guerra (...). A guerra ofensiva.».
Para que a Alemanha «dê leis ao mundo, se não mesmo para que se 'civilize' o mundo, à sua imagem e semelhança.»
E lucidamente, remata:
«para civilizar o mundo (o Império) irá ocupar mercados que sejam verdadeiras colónias, aliados que sejam verdadeiros servos«(pp. 154-155).
Seria este embaixador português apenas um grande talento, que captou aquele momento singular, ou um autêntico génio, que percebeu como poucos a intemporalidade do Deutschland übber alles?"
Diogo Freitas do Amaral na crónica de opinião "O que é a Alemanha?" in Visão nr 1028
É assustador, como o que aconteceu antes da 2ª Guerra Mundial em termos económicos parece estar a acontecer de novo! E a História ensina-nos que a dívida e o desemprego carregam o fim dos regimes democráticos, depois a fome, e finalmente a Guerra!
"A Alemanha esqueceu as lições dos anos de 1930, quando a obsessão pelo equilíbrio orçamental agravou a depressão que os conduziria, por fim, à Guerra. Dá sermões aos vizinhos, pede-lhes que a imitem mas Merkel esquece que os seus excedentes são os défices dos outros"
Joseph Stiglitz, laureado com o Nóbel da Economia em 2001, vice-presidente e economista-chefe do Banco Mundial, autor de livros como "O triunfo da Ganância", "A Grande Desilusão", "Um outro Mundo" ou "O preço da Desigualdade".
Recentemente disse numa entrevista relativa à crise que "a austeridade é o suicídio da Europa".
"A rainha das dívidas do século XX foi, afinal, a Alemanha. Esteve insolvente pelo menos três vezes", garantiu o historiador Albert Ritschl ao jornal alemão Der Spiegel. O milagre alemão deve-se, sustenta ele, às generosas injecções de capital norte-americano, ao perdão das dívidas astronómicas e ao facto de o país não ter pago os custos da guerra, deixando-os para os países vítimas de ocupação". [li numa Visão de Novembro]
Da Alemanha partiram as três Guerras Mundiais (I, II e Guerra Fria) que acabaram na divisão da Europa por 4 décadas. Como foi possível a um país, que nas primeiras décadas era o mais produtivo e vanguardista nas ciências e nas artes, na técnica , na filosofia e nas letras, cair, democraticamente , na mais abjecta das barbáries?
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sobre a austeridade:
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